* Pesquisa realizada como aluna do Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal da Bahia, com financiamento da CAPES, pelo Programa de Doutorado Sanduíche no Exterior, e da Fapesb, pelo Programa de Bolsa de Doutorado.

quarta-feira, 30 de setembro de 2015

EDUCAÇÃO BILÍNGUE, UMA BREVÍSSIMA INTRODUÇÃO

Como prometido, encerrando os textos dedicados ao Setembro Azul, falo um pouco sobre a educação bilíngue, importante reivindicação do movimento surdo. Há um número significativo de surdos, de familiares e de profissionais que se dedicam a estudar a surdez que lutam pela garantia de que os surdos recebam sua escolarização em língua de sinais; considerada a língua natural dos surdos, por ser aquela à qual eles podem ter um acesso irrestrito, caso expostos a um ambiente em que é usada de forma significativa. Neste caso, o português, na sua versão oral e/ou escrita, assume o papel de segunda língua e é por isso que falamos em educação bilíngue.

Para explicar a necessidade de que os surdos sejam escolarizados em língua de sinais, muitas vezes, compara-se a experiência do surdo inserido em uma classe regular, sem adaptação, àquela de crianças que são escolarizadas em um idioma diferente do seu. No entanto, eu sempre acho que essa comparação não nos dá a verdadeira medida do que passa uma criança ou adolescente surdos nessa situação. Há pelo menos dois fatores que precisam ser levados em consideração.

Em primeiro lugar, não se trata apenas de outra língua, mas de uma língua à qual o surdo tem um acesso apenas parcial e não espontâneo, ou seja, depende de um trabalho de habilitação auditiva e educação da palavra. Então, imagine que você se comunica oralmente, mas frequenta uma escola onde as pessoas se comunicam telepaticamente. Elas não emitem sons, mas movimentam seus lábios de acordo com o comprimento e intensidade das ondas mentais pelas quais se comunicam. Aos poucos, você até percebe a repetição de certos padrões de movimento e pode decodificar pequenas mensagens, mas, imagine como seria compreender todo o conteúdo de história, matemática, geografia, física... apenas a partir desses sinais precários. Certamente, essa é uma imagem fantasiosa que também tem seus limites, como toda comparação, mas me parece mais precisa.

Em segundo lugar, mesmo quando a criança se comunica de forma oral e via leitura labial, para o surdo, a inserção na língua falada se dá em um ritmo diferente daquele vivido pela criança ouvinte, que tem acesso irrestrito e imediato ao som. Na escola, a criança surda, em processo de oralização, está exposta a uma dupla tarefa: aprender a linguagem e aprender os conteúdos; ou seja, ela não dispõe um referencial conceitual sobre o qual se apoiar para se apropriar dos conteúdos, seu vocabulário se constrói simultaneamente, dificultando enormemente sua compreensão. Isso resulta, muitas vezes, em uma escolarização na qual a forma da comunicação assume um papel mais importante do que o conteúdo escolar e do que a função expressiva da linguagem.

O debate se estende também às diferentes formas possíveis de implementação do bilinguismo na escola. Há quem considere que nenhuma experiência atual corresponde ao que seria uma educação verdadeiramente bilíngue. A discussão não é simples e provoca polêmicas acaloradas. Opiniões contrárias à educação bilíngue são desenvolvidas por profissionais competentes, que apresentam argumentos diversos. No entanto, uma coisa é certa, ainda não encontramos uma proposta satisfatória para a educação dos surdos, que não apenas atenda às suas necessidades, mas que se apoie sobre suas potencialidades.

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